sábado, 25 de fevereiro de 2012

Diário de um Medroso

Escrito por: Augusto Gattone

   Serpentes? Eu tenho uma enorme no meio das minhas pernas. Aranhas? Opa, ta ai uma coisa bem legal de se ver. Lugares apertados? Palhaçada, claustrofóbicos são apenas pessoas com medo de admitir que não conseguem enfrentar sozinhos seus problemas. Altura? Porra, fala sério, nós nascemos para voar!

   Tenho medo de outra coisa.

   Suponho que esses sejam os medos mais comuns. Mas existem outros.

   Eu não tenho medo nenhum daquela criatura gosmenta que se escondeu atrás do armário do meu quarto, parecendo um grande cérebro ou um coração com quatro enormes olhos amarelos. Às vezes ele fala um gelado sussurro.

   Não tenho medo daquele homem que começou a aparecer na calçada por onde eu passo, com seu uniforme militar aos trapos, mostrando-me momentos da minha vida em fotos. Anteontem era um bebe. Ontem um adolescente, e hoje de manhã foi meu corpo apodrecendo dentro de um caixão.

   Não tenho medo do enorme buraco perto do meu fogão, que leva a um túnel que parece ser infinito, com paredes feitas de pele humana e ossos, coberta de bocas com dentes afiados que estão sempre falando em algum idioma que humano algum jamais falou. Se eu entrar lá, insetos enormes vão querer entrar pelos meus orifícios e vermes gigantes vão sair das paredes para tentar me devorar.

   Não tenho medo da gigantesca possa de sangue no parque, que parece ter vida própria. Dependendo da hora do dia, se eu me aproximar, vejo o reflexo de minha alma, escura, densa. Ou, de vez em quando, vejo um navio pirata que leva a um abismo, no subsolo do universo, com feixes de luz que brotam por uma fonte invisível. Coisas nadam nessa fonte, muitas coisas estranhas.

   E eu não tenho medo do ser que me segue por aonde eu vou, e eu acho que só não o via antes por que eu não queria ver. Ele é parecido com uma enorme marionete ventríloqua, com três vezes a minha altura. Não tenho medo nem quando ele me acorda no meio da noite, alisando seu órgão sexual nas minhas pernas, não tenho medo nem quando ele me olha pela janela enquanto tento dormir, e, por um instante, tenho a impressão de estar vendo a mim mesmo, como um reflexo.

Não só não tenho medo, como também não me lembro de ter tido medo alguma vez na vida. E acho que sei por que. São eles, que tiram meu medo, se alimentam dele. Ou melhor, é mais um... Casamento. Sim eles estão ligados, de alguma forma, ao meu medo. É o próprio medo. Minha arma contra o medo.
   
   O Medo encarnado.
Agora, antes de terminar de ler esse relato, faça uma pausa, trinta segundos é o suficiente.

   O que é medo para você?

   O que seria covardia?

   E pânico?

   E o que é terror?

   Bom, enfim, não lhes devo uma explicação. Mas se você sabe responder a todas essas perguntas, sinto muito. Eles já devem estar lá nesse momento. Em seu armário, debaixo da sua cama, dentro do espelho, ou atrás da porta. E eu só tenho um medo.

   Eu tenho medo do que eles podem fazer com você quando encontrá-lo.

   Sinto muito, mas foi minha única saída.

   Espero que entendam antes que seja tarde demais, e acabem em um lugar como o que eu me encontro. Criei um mundo inteiro para mim, e fiquei com medo da realidade.

#Fim# E tome cuidado lá fora.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

O Rei dos Reis

Escrito por:Augusto Gattone
 
    Tenho em mim todos os sonhos do mundo.

   Eu sou um Deus, sou um pistoleiro, sou um guerreiro, sou um caçador, sou um assassino, sou a luz, sou a escuridão.
   Eu sou o dia, eu sou à noite. Sou excêntrico, sou viajante do tempo. Eu sou o rei de tudo e de todos.
   Eu vivo em um castelo, rodeado por florestas mágicas, cheias de vida e encanto, sou tão forte que coloco o sol para dormir todos os dias.
   Poderia ficar aqui por um bom tempo contando historias sobre minhas batalhas, meus duelos de magias, ou minhas lutas contra dragões.
   Ou como da vez em que lutei contra um leão sedento por sangue.
   Estava andando pelo vale das sombras a procura de caça, um hobby que tenho a milênios de anos, antes mesmo da extinção dos dinossauros eu já era um exímio caçador. Naquela tarde por puro azar, decidi levar apenas minha lança para caçar.
   Eu estava sozinho como de costume, rodeado pela densa floresta do Vale Das Sombras, o lugar mais perigoso e remoto de todo o mundo, e um silêncio assustador pairava no ar aquele dia.
   Algo estava errado, eu tinha certeza. De re pente, ouço um enorme e barulhento rugido, na hora eu não sei o que passou pela minha cabeça, não tinha idéia de que diabos era aquilo.
   Então do meio das arvores, correndo como a luz, surge um leão enorme, pulando em minha direção, cravando as garras em meus ombros e tentando morder meu pescoço.
   Porém eu sou um Deus se lembra? Nada pode me deter muito menos um leãozinho daqueles. Com toda a força que me restava eu chutei a barriga do felino e ele voou para frente e bateu bruscamente em uma arvore, levantei-me e fiquei preparado para outro ataque.
   O Leão se levantou meio atordoado e começou a andar em círculos, olhando diretamente nos meus olhos, minha lança não ia ajudar em muita coisa, por isso a joguei no chão e decidi usar a força bruta, uma força que adquiri ao longo dos séculos, matando dragões, monstros, gigantes e qualquer outra coisa que se rasteje. Então o Leão veio, fechei meus olhos e me concentrei, e instantes antes do leão me abocanhar, eu o agarrei pela mandíbula e o matei, rasgando-o de ponta a ponta.
   E então dei um grito de guerra! Um grito agudo e estridente, talvez se você passar pelo Vale das Sombras um dia desses, você ouça o eco do meu grito, são o que alguns caçadores que passam por lá dizem, mas isso é apenas uma lenda, não vem ao caso.
   Para terminar, você deve estar se perguntando que diabos eu sou? Eu sou um Deus, sou um pistoleiro, sou um guerreiro, sou um caçador, sou um assassino, sou a luz, sou a escuridão. Eu sou o dia, eu sou à noite. Sou excêntrico, sou viajante do tempo. Eu sou o rei de tudo e de todos.
   Pois bem, sou apenas um garoto sonhando alto, dando asas à imaginação, deixando as palavras tomarem forma, e assim podendo viajar na riqueza de um sonho. Sonhos não morrem jamais, apenas adormecem na alma da gente.

#FIM#

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

A Caminho do Inferno

   Escrito por: Augusto gattone

   Baseado em um incrível homem, que foi um verdadeiro herói. Talvez vocês já ouviram falar de Audie Murphy, o homem que foi ao inferno e voltou.

   Menos de cinqüenta quilos, um pouco mais de um metro e meio de altura, febril, com dor de cabeça e enjoado, Murphy se tornou um eficiente, dedicado e mortal guerreiro durante a Segunda Guerra Mundial.  Comandando uma dúzia e meia de homens treinados para matar dentro de alguns tanques que segue em direção aos alemães.
   Ele não sabe quantos são, nem tem para onde fugir. E como se não bastasse, ouviu dizer que os inimigos estão com um novo rifle com enorme poder de fogo.
   Murphy tem apenas vinte anos.

   Ao longe, se vê os tanques inimigos se aproximando. Era um homem dele para cada tanque alemão. O seu melhor amigo, de dentro de um tanque, começa o ataque. 
   Murphy com um rifle de precisão, detrás de uma pedra acerta qualquer um que não estivesse protegido.

   Ouve-se um estrondo como o de um trovão, de repente o calor aumenta. Murphy olha para trás e vê o tanque de seu amigo pegando fogo.
   Ele podia ouvir seus gritos de dor. Em meio aos sons aterrorizantes de guerra, todos ouvem nitidamente a voz aguda mandando que recuassem. Enquanto seus homens fogem, Murphy entra no tanque em chamas e começa a atirar nos alemães.

   Os minutos se passando, a febre e a náusea aumentam. Sangrando e completamente exausto, Murphy vai parando um a um os tanques inimigos, um a um. A fumaça começa a tornar sua respiração cada vez mais difícil.  Ele imagina que, mesmo sendo um assassino sem anseio em matar, nenhum inferno poderia ser pior do que aquele.  
   Outro pensamento angustiante passa por sua cabeça: Ele não é um assassino, ele gosta mesmo é da batalha de alguma forma ele se sente bem. Mas quem se importa com isso?  No final não vai fazer a menor diferença.
   Cinqüenta e dois minutos depois, quase todos os inimigos morreram. E aquele maldito tanque ainda pegando fogo, poderia explodir a qualquer momento.
   O cheiro de sangue, carne queimada se alastra pelo ar. A munição acaba. A adrenalina rasga um sorriso no rosto de Murphy.
   É hora da cartada final.

   Murphy sai do tanque e atira contra os inimigos com uma pequena pistola, enquanto foge. O último tiro mata um alemão que tentava fugir desesperadamente, e ele joga a pistola fora.
   Começa a correr com todas as forças. Corre sem olhar para trás. Tiros por todos os lados, e buracos de balas começam a nascer a sua volta, mas ele não para, nada pode pará-lo. Ao descer a colina, bem a frente dos inimigos, Murphy viu seus soldados aguardando ordens.

  -Comandante, onde você estava?- Um deles grita em tom insaciável.
  -Eu fui ao inferno e voltei-Ele responde.
   O tanque explode bem atrás dele, apenas meia-dúzia de inimigos sobreviveram.
   Murphy cai no chão, rola alguns metros, mas logo se levanta e continua a correr, sem necessidade, mas por reflexo ele grita. - Ataquem!

   Todos os soldados vão para cima dos inimigos. Eles tentam fugir, mas são todos alvejados. E Murphy continua a correr em direção do sol. 
   Já não pensa mais, às vezes ele vê alguns tiros imaginários o perseguindo. Mas nada pode Pará-lo. Corre como se não existisse amanha, como se nada mais importasse.
   Não olha para os lados, não olha para trás e, talvez, também não olhe para frente. E continua a correr.
   Continua a correr pelo resto de sua vida, até morrer em uma fria tempestade de raios anos depois.  Só o que resta é a duvida que seus soldados tiveram quando o viram fugir daquela enorme explosão.
   -Fugindo ou tentando alcançá-la?                                                                        

#FIM#